Como eu o entendo...
Parece que já acabou mas, mesmo assim, aqui fica um pequeno conto em glória desta bela quadra de convívio familiar.
O PATUSCO
Lá em casa tínhamos um cão, um grande cão pastor da Serra, que o meu pai arranjara por via dos ladrões. Às vezes atirava-se às pessoas, só por brincadeira, claro. Também comia que se fartava, andava sempre a farejar aquilo a que pudesse deitar o dente. Comigo dava-se bem, saltava quando eu dizia para saltar, deitava-se quando eu o mandava deitar, tudo. Era o Patusco, nome inventado pela prima Josefina que lhe achou muita graça quando o viu pela primeira vez, era ele pequerruchinho.
Um dia estava lá em casa o primo Zezito, aquele que depois partiu a espinha no Luna Parque. Mas nessa altura ainda não tinha partido e estávamos os dois a brincar com o Patusco.
Então bateram ao portão e era a avó Amélia, que também ainda não tinha caído da Montanha Russa.
Eu e o Zezito deixámos o Patusco sossegado e fomos abrir.
A avó veio por ali dentro aos tropeções como era seu costume, a perguntar pela mãe. Disse-lhe que estava lá dentro a coser à máquina e olhei para o Zezito. O Zezito ficou atento e abalou a correr para a cozinha.
Quando a avó Amélia ia a chegar à porta de casa, depois de ter atravessado o jardim, muito contente, volta o primo Zezito esbaforido, com qualquer coisa escondida atrás da costas.
E pumba, puxou de um bife com um alfinete curvado na ponta e catrapuz, pendurou-o no fim das costas da avozinha.
A avó Amélia não deu por nada, sabem, estava sempre distraída.
O Patusco já vinha por ali a farejar.
Foi só dizer salta e o Patusco saltou.
O Zezito rebolava-se no chão, agarrado à barriga. Eu também já não podia mais.
Acabaram tirando o Patusco de cima da avó. E levaram-na para o Hospital da Misericórdia. Quando saiu de lá foi para, pouco depois, ter a infelicidade de se esborrachar lá na Montanha Russa do Luna-Parque. Coitadita.
Mas o meu pai não achou bem que tivéssemos feito aquilo e, por isso, não pudemos ir ao cinema no domingo.
Era engraçadíssimo, o primo Zezito. Pena é que lhe tenha acontecido aquela coisa à espinha.
A infância nunca nos sai da memória!
Mário-Henrique Leiria, Novos Contos do Gin
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